ENTREVISTA DO PROFESSOR JÚLIO FURTADO AO JORNAL O DIA/RJ EM 28/03/2003
Esta semana uma diretora de escola foi espancada por um aluno dentro de sala de aula. Em sua opinião, qual é a causa para tanta violência no ambiente escolar?
O senhor acredita que os casos de agressão se acentuaram nos últimos anos?
Sim. A violência nas escolas vem aumentando proporcionalmente à violência na sociedade como um todo. Não é um fenômeno isolado, muito menos destoante. Numa tentativa de síntese, eu diria que esse aumento, além de reflexo social, é fruto de uma sociedade imatura emocionalmente, que por sua vez é resultante de uma educação insegura no tocante à colocação de limites e ineficaz com relação à construção da autonomia.
De que forma as famílias podem ajudar a combater os casos de violência?
As famílias precisam acreditar e assumir a proposta pedagógica da escola e, para isso, essa proposta precisa ser discutida e reavaliada coletivamente a cada ano letivo. As famílias precisam ser envolvidas nas situações que incluam aspectos relativos à formação de valores que nascem na solidez de princípios. Falar alto, xingar palavrão, agredir, pegar o que não lhe pertence, arrotar, etc. são comportamentos que sinalizam baixo nível de civilidade. A escola precisa ter um plano de gestão da disciplina e isso inclui ações relativas à falta de civilidade. Essa questão é, na maioria das vezes, encarada pela escola como papel exclusivo da família (“Educação vem de berço!”), mas na verdade é também papel da escola.
O que pode ser feito para melhorar essa situação?
Na minha opinião algumas questões precisam ser urgentemente repensadas:
- A escola precisa distinguir indisciplina e incivilidade. Isso ajuda a planejar ações mais eficazes. Como já disse, a incivilidade é qualquer comportamento oposto à chamada “boa educação” e que, por consequência, atrapalham as relações na escola. A indisciplina é fruto da quebra de uma conduta estabelecida, essencialmente voltada ao sucesso da aprendizagem (fazer as tarefas de casa, não brincar durante as aulas, trazer o material escolar, cumprir os horários, etc).
- A escola precisa criar regras que se fundamentem em princípios, caso contrário, terão que impor regras e não educar através delas (usar uniforme, por exemplo, é uma regra baseada no princípio da igualdade e da segurança. Usar meia branca com uma listra azul é pura convenção, sem princípio que fundamente).
- A escola precisa dar destaque às regras baseadas em princípios inegociáveis (agressão física e verbal, roubo, preconceito, etc.). Essas regras precisam ter destaque no cotidiano escolar e o não cumprimento delas precisa ter consequências claras para todos.
- A escola precisa encarar o conflito e educar através dele. A proibição e a contenção não educam, apenas controlam. Educar pressupõe lidar com conflitos. (As câmeras nas escolas ajudam a controlar e a dar segurança a todos, mas não podem ser encaradas como um elemento que disciplina. Como agem os alunos quando não existem câmeras?)
- É preciso que a escola tenha um projeto político pedagógico que inclua um plano de gestão da disciplina e que esse plano seja discutido e assumido por toda a escola, incluindo a família.